domingo, 3 de fevereiro de 2013

A casa da minha memória





Por Bárbara Anaissi


O aroma de um bolo de chocolate assando. Purê com carne moída. Uma varanda cheia de plantas que era o meu Jardim Botânico. Uma casa de bonecas pendurada no teto e feita com caixote de feira e corda. Meu primeiro cachorro. A risada do meu tio. Uma estante que já passou por muitas casas e me acompanha até hoje. Programa do Chacrinha na TV com minha avó. O cheiro de lavanda do meu avô. A voz da minha mãe.

Bem pequena eu sentava no colo do vô para ouvir suas invenciones. Eu não entendia quase nada, mas mergulhava fascinada naquele imaginário. À noite, quando chegava do trabalho, minha mãe me colocava na cama misturando histórias que sabia de cor. Às vezes o cansaço vencia a delicadeza materna e eu, ainda bem acordada, reclamava: “Mãe, a Cuca não corre atrás da Chapeuzinho Vermelho!”.

Estas são as lembranças da minha primeira casa. Na verdade, um apartamento imenso aos meus olhos de criança. Morei lá até os 10 anos, mas não nasci lá. Mas não me lembro de nenhum outro lar antes deste. 

Rua General Polidoro, Botafogo. Um prédio de três blocos e dois andares, sem elevador. A escada grande e larga era o local preferido de brincadeiras. E o corredor sempre bem encerado que unia os três blocos também. Meu joelho não me deixa esquecer este corredor. Carrego até hoje uma cicatriz das corridas disputadas com os amigos.

Ao lembrar aquela época vejo com uma nitidez impressionante a menina que fui. Os cabelos ainda lisos batiam no ombro, um conjunto de short e blusa amarelo era o preferido. Susi e Beto eram meus companheiros de brincadeiras e Monteiro Lobato aparecia antes do meu sono.

A menina se debruçava todas as noites na janela aguardando a mãe chegar do trabalho. De manhã era o tio quem chegava trazendo o pão quentinho. A prima, já adolescente, chegava de madrugada da diversão. Todos chegavam e a menina e a avó esperavam.

Aos domingos a família preenchia a cozinha para fazer arroz com lentilhas, kibes, esfihas. E o avô ensinava palavrões em árabe para os netos. E contava a história de seu pai vindo do Líbano.

Tios e tias, primos e primas, avô e avó, mãe. Família, risadas, carinho, leituras e brincadeiras. Essa casa traz um tempo bom...
            

4 comentários:

  1. Que texto delicado! Seu texto me levou a pensar na infância, lembrar.
    Beijo,
    Edna

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  2. Desculpe a demora, mas não estava me entendendo com este espaço. Quando eu escrevia e apertava o enter, tudo sumia. Que mágica!
    Hoje consegui!
    Bem, adorei o texto Bárbara. Fiquei tentando imaginar a figura do avô e da avó.É tão legal essa sensação após ler um texto. Parece que queremos sempre mais.

    Abraços, Juliana

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  3. Estava como Juliana. Não conseguia me entender com o blog.
    Muito gostoso, Bárbara, entrar nesses cacos de memória. Parabéns!
    Beijo
    Claudia

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